Lowsumerism: a onda do baixo consumo
Na semana passada, a agência de tendências Box 1824 lançou um vídeo chamado “The Rise of Lowsumerism” – algo como “A escalada do baixo consumo”. Você pode conferir o resultado abaixo.
O vídeo traz algumas questões interessantes sobre a evolução da nossa forma de consumo, o papel da propaganda e as diferenças geracionais. Não há dúvidas de que chegou a hora de discutirmos os nossos padrões de vida e a forma como consumimos. O crescimento do movimento por alimentos orgânicos, o fortalecimento do consumo local, o surgimento de plataformas de trocas, a expansão da cultura maker e o surgimento de moedas sociais são sinais disso.
O vídeo vem discutir apenas uma peça nesse quebra-cabeça: a responsabilidade crítica do consumidor como indivíduo que faz parte de uma comunidade maior.
A ECONOMIA COLABORATIVA
Em um certo momento do vídeo, o tema é a “sharing economy” – economia colaborativa, ou mais especificamente o que chamamos de economia compartilhada, mas não vale a pena entrar nos detalhes da terminologia aqui.
Há também uma crítica ao modelo:
“Embora a economia compartilhada pareça um passo a frente, ela não reduz de fato o nosso desejo de consumir”
Vale notar dois pontos importantes.
1- Quando o vídeo fala em “sharing economy“, ele se refere especificamente a modelos de compartilhamento de bens materiais como carros, bicicletas, ferramentas e casas. A economia colaborativa é muito mais do que isso, mas para o objetivo do vídeo, ele foca apenas do consumo colaborativo, não no movimento como um todo.
2- Sim, o vídeo tem razão quando diz que esses modelos “não reduzem de fato nosso desejo de consumir”. Por outro lado, eles reduzem sim o consumo total e, em consequência, a produção de bens e o uso de recursos. Existem diversas críticas possíveis a estes modelos, mas o consumo colaborativo muda sim a forma como consumimos. O objetivo do vídeo porém – e isso fica claro neste segmento – é atacar o desejo do consumo, não o ato de consumir em si.
O CRESCIMENTO ECONÔMICO
Existe uma questão de fundo, não abordada diretamente no vídeo, que está no centro de todo o problema: o único modelo econômico vigente é o de crescimento infinito. Mas qualquer modelo de crescimento infinito em um ambiente finito – como o nosso planeta – é, por definição, insustentável a longo prazo.
A única métrica que usamos atualmente para medir o sucesso de uma nação é o crescimento percentual do seu Produto Interno Bruto (PIB). Mas o PIB “mede tudo, menos o que faz a vida valer a pena“. Não mede prosperidade, felicidade geral, qualidade de vida. Ele mede apenas a quantidade de relações econômicas acontecendo em um país. Quanto mais consumirmos, maior será o PIB, maior será o crescimento.
Por isso, a discussão acerca do consumo é tão importante no nosso momento atual.
Mas ela não passa apenas pelo comportamento individual dos consumidores. Essa mudança de cultura é fundamental. Mas será que, como sociedade, estamos preparados para as consequências?
As economias passariam por um desaquecimento, empregos seriam perdidos, haveria recessão em vários aspectos. Todo o nosso ambiente econômico foi criado para sustentar o consumo em massa e agora depende dele para sobreviver.
Temos que consumir menos. Muito menos. Todos têm absoluta responsabilidade. Mas, para isso, temos que também mudar a forma como enxergamos nosso sucesso econômico e estruturamos as nossas relações de trabalho.
E esta é uma questão muito mais profunda do que o simples ato de consumir.
A LINGUAGEM
Boa parte da crítica do vídeo se faz em cima da propaganda e a forma como essa ferramenta influenciou nossa cultura ao longo das últimas décadas. O curioso é perceber que essa crítica se utiliza da mesma linguagem publicitária para comunicar suas ideias.
No livro O Ponto de Virada, Malcom Gladwell explica tendências de comportamento como epidemias que se espalham pela população seguindo o mesmo padrão de um vírus. Um dos elementos mais importantes é o que ele chama de Fator de Fixação, que é o poder que uma ideia, mensagem ou atitude tem de causar impacto em quem é “infectado”.
Quanto mais alto o Fator de Fixação, mais forte é o “vírus”, ou seja, mais claramente a mensagem é percebida e “gruda” na mente das pessoas.
O poder da linguagem publicitária é inegável. Tanto é assim, que a propaganda não só criou vários dos caminhos que nos trouxeram até essa crise de consumo, como nesse vídeo foi usada como mecanismo para sairmos dela.
É uma discussão interessante. Einstein dizia que não se pode resolver um problema com o mesmo modelo mental que o criou. Mas será que nesse caso a melhor forma de atacar o poder da publicidade tradicional de gerar um consumismo desenfreado é usando a mesmíssima linguagem, porém com a mensagem oposta?
Fica a reflexão.
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[…] Este texto foi originalmente publicado no Blog da Benfeitoria. […]
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